Um dia dedicado à “Consciência Negra” (20 de novembro) é um convite para todos nós – brancos, negros, morenos, pardos, amarelos e misturados, em geral, – festejarmos o balaio de cores, ritmos e sabores de que é feito o Brasil. O respeito à resistência negra diante dos violentos interesses econômicos da colonização das Américas, junta-se, hoje, ao reconhecimento de que a cultura afro-brasileira nos dá muito da nossa razão de ser. Neste espírito, nada melhor que convocar dois ícones da nossa mestiçagem: o sabor da feijoada e o saber do poeta Vinícius de Moraes.
A feijoada, que teve sua origem na cozinha europeia, ganhou brasilidade pelas mãos das negras cozinheiras. Como relata Câmara Cascudo, ao contrário de outros modelos de colonização, “[no] Brasil a presença da preta na cozinha classificava-se como indispensável. Era a mais comum, natural e própria das ocupações” (1968: p. 474). Nos tachos das negras e no paladar de senhores e escravos, a feijoada virou símbolo nacional. Este ano, o prato foi inclusive o eleito como o melhor representante da culinária brasileira, na edição de novembro da Revista Menu, – e entre o que votaram na feijoada estava o Chef do El Celler de Can Roca, eleito o melhor restaurante do mundo pela
The World's 50 Best Restaurants 2013.
Já o poeta Vinícius de Moraes – no qual comemoramos, no ano de 2013, o centenário de seu nascimento – manteve-se fiel à crença de ser o preto mais branco do Brasil. Em sua clara admiração pela cultura negra, o Poetinha nos deixou um imenso repertório. Os resultados mais famosos estão no disco “
Os Afro-Sambas” gravado com Baden Powell em 1966 e na peça de teatro “Orfeu da Conceição” encenada pela primeira vez em 1956. Na ocasião, Vinícius teria declarado que “Todas as personagens da tragédia devem ser normalmente representadas por atores da raça negra, não importando isto em que não possa ser, eventualmente, encenada com atores brancos”, o que retrata bem a relação do poeta com a raça: ela é uma potência de criatividade, mais que uma fixação.
Em homenagem à beleza das artes e dos sabores afro-brasileiros, vai aqui o passo a passo da “Feijoada à minha moda” do livro “Pois sou um bom cozinheiro” que copila causos e receitas do universo gastronônico de Vinícius. Ouça o Poetinha cantando com o Baden e o Quarteto em Cy e inspire-se no remexer das panelas.
Feijoada à Moda de Vinícuis de Moraes
600g de CARNE-SECA
1Kg de FEIJÃO-PRETO
TORRESMINHO (3 a 4 receitas, veja p.85)
3 CEBOLAS grandes picadas em cubos
6 dentes grandes de ALHO picados fino
1 TOMATE MADURO sem sementes picado em cubos
2 folhas de LOURO
400g de LÍNGUA BOVINA FRESCA
400g de CARNE DE PEITO BOVINO
400g de PAIO DEFUMADO, cortado em rodelas de 1,5 cm, aproximadamente
600g de LINGUIÇA CALABRESA DEFUMADA
12 LARANJAS geladas, em fatias
SAL e PIMENTA a gosto
Preparo
1. De véspera , dessalgue a carne-seca, cate o feijão e coloque-o de molho em água fria.
2. Para começar, prepare os torresmos e reserve a gordura para refogar os temperos e a couve. Em parte dessa gordura, refogue a cebola, o alho e o tomate. Coloque o feijão para cozinhar nessa mesma panela, adicione as folhas de louro, a língua bovina fresca (sem pele) e o peito bovino em pedaços. Cubra com água e deixe cozinhar em fogo bem baixo com a panela semitampada. Na metade da cocção adicione a carne-seca. O paio deve ser acrescentado aproximadamente 30 minutos antes de servir, para que não se desmanche no caldo.
À parte, frite a linguiça em rodelas até que dourem e reserve a gordura da fritura.
3. Vá provando o feijão de tempos em tempos até que o perceba macio. Então, retire um punhado dos feijões com um pouco de caldo e amasse-o com o auxílio de um garfo, para obter uma pasta - se necessrário, adicione mais caldo e leve essa pasta de volta à panela, mexendo até encorpar. Quando a feijoada estiver apurada, ajuste o sal, se necessário.
4. Sirva com a linguiça e o paio fritos, os torresmos, uma farofa simples frita na manteiga, couve refogada, rodelas geladas de laranja, molho de pimenta-malagueta e outras pimentas frescas.
Fontes:|Cascudo, Câmara,
História da Alimentação no Brasil – Segundo Volume, Companhia Editora Nascional, 1968.
|viniciusdemoraes.com.br
|revistamenu.com.br
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Pois sou um bom cozinheiro - Receitas, histórias e sabores da vida de Vinicius de Moraes
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Feijoada, Receitas